#EleNão: O Que Podemos Aprender com Anitta e o Ativismo de Marcas?

setembro 24, 2018

Ela disse #EleNão. 

Esse foi o resultado final da polêmica discussão envolvendo a Anitta e a ativa campanha.

Ela se pronunciou em seu Instagram após ter sido “desafiada” pela Daniela Mercury a aderir à hashtag, criada como oposição à eleição do candidato Bolsonaro por seus discursos racistas, homofóbicos e machistas.

Entretanto, antes desse desfecho, a cantora foi inicialmente resistente em participar das discussões políticas:

“Eu disse que eu não voto em candidato machista, eu não voto em candidato homofóbico, racista e por ai vai. A gente vive em uma democracia, eu respeito a escolha de voto de todo mundo, eu não vou participar de jogo político e mais uma vez repito, que eu não gostaria de ver a minha imagem atrelada a isso”

E reforçou posteriormente durante um show em São Paulo:

“O posicionamento não significa uma hashtag. O posicionamento significa toda uma vida que a gente trabalha e a gente faz. As nossas atitudes falam muito mais do que qualquer coisa que a gente possa dizer, postar”

Quem me acompanha no Instagram, acompanhou a discussão. Eu recebi uma mensagem pedindo para que eu avaliasse o então “não posicionamento da Anitta”.

Aqui eu compartilho um pouco do que foi discutido no stories (com a contribuição de várias pessoas) e as minhas conclusões.

 

Não Posicionamento 

Na verdade, a Anitta se posicionou. O não posicionamento político (ao menos partidário) é um posicionamento. E como todo posicionamento, há polarização. Há aqueles que concordam e outros não.

Anitta, após as críticas, fez questão de deixar claro em seu perfil qual a sua história e com o que ela se importa:

“Essa sou eu. Eu sou contra a violência, contra a discriminação de qualquer espécie. Sou contra o ódio e a intolerância. Sou a favor da igualdade de gênero, contra a homofobia e o racismo. Defendo a liberdade do outro de decidir o que fazer com seu corpo. Através da minha arte tento contribuir com o que posso para vivermos num mundo melhor e mais igualitário”

Além disso (e talvez acima de tudo), ela também se posicionou em suas falas a favor do respeito à escolha do voto e da tolerância e, por isso, segundo ela, não fazia sentido associar-se a disputas políticas, envolvendo seu nome a um candidato (mesmo que de forma indireta):

“Anos de trabalho na minha carreira de cantora em que apoiei de diversas maneiras as idéias que acredito não vão ser apagados por não querer me envolver com política, pelo menos não para mim. Respeitem o próximo e suas decisões. Isso sim vai ajudar a sermos uma sociedade tolerante. Nós somos esse país”

Mesmo até o momento não tendo aderido à campanha contra o Bolsonaro, no que se refere ao seu posicionamento como marca pessoal, Anitta “seguiu as regras”, se expôs e se pronunciou. Mesmo não tendo agradado boa parte do seu público fiel.

 

A Marca Nos Representa

Uma marca não é mais o que um consumidor diz que ela é. É o que ele diz sobre ela para os outros.

E pra que isso aconteça é preciso que essa marca de alguma forma o represente, para que ele tenha confiança em indicá-la, a referenciá-la a quem está ao seu redor.

A marca de uma pessoa ou uma empresa envolve mais do que uma transação comercial. Envolve representatividade: um conjunto de seus valores, visão, comportamento, estilo de vida, discursos…

A conexão emocional é um fator inquestionável na decisão de compra e faz com que a marca deixe de ser apenas uma commodity, comparada apenas por seus atributos racionais, deixando então de competir apenas por preço.

Por isso, a marca deve deixar claro em suas atitudes e em sua comunicação pelo que ela se posiciona, o que ela defende, o que a move. Pois é assim que o seu público se engajará e se tornará fiel a ela.

 

Na saúde e na doença?

O público fiel que sempre acompanhou a artista desde o seu início é formado em grande parte por homossexuais e feministas. E foi esse o grupo atacado pelos discursos do candidato à presidência.

O pedido de adesão à campanha, foi quase como um pedido de casamento: será mesmo que você, Anitta, está ao nosso lado nos momentos bons e nos ruins?

Entretanto, para aqueles que prezam pela liberdade, essa é uma decisão difícil. E que vem com seus ônus e bônus.

Claro que aqui a decisão nada está relacionada aos termos de um casamento, mas em um paralelo, talvez Anitta pensasse que a ação de se comprometer politicamente não seria necessária e ela teria essa liberdade de escolha. O que não foi o caso.

Talvez a Coca-Cola como marca pudesse bancar tal posicionamento. Mas a decisão de Anitta (e/ou seu time) de voltar atrás, mostrou que não era o caso e que as consequências de tal postura poderiam ser irreversíveis.

 

Estratégia, Condescendência ou Coerência?

Durante a discussão no stories, me perguntaram: o posicionamento da Anitta foi correto?

Não há como saber. Pois não há como ter acesso à sua visão, à sua verdadeira missão ou mesmo quais são os seus valores mais profundos.

Eu tenho o que está na mídia e não o que está em sua mente. Mas de toda forma, eu tenho as minhas hipóteses.

O que poderia ter levado a Anitta a não aderir a #?

 

Erro de autoavaliação:

Talvez Anitta tenha sido muito otimista com relação ao poder de sua marca. Artista número 1 no país e no auge de sua carreira, pode ser que ela tenha mantido em mente que ela não mais apenas representa um grupo, mas sim uma nação inteira.

E por isso a sua imparcialidade política faria sentido e seria vista como bom senso pela população. Entretanto, o que ela pode comprovar é que o público que se mantém fiel é ainda o mesmo do início de sua carreira. Quem tem voz é quem se importa. E foi esse público que falou mais alto ao ter a sua representatividade na cantora ferida.

 

Foco na Estratégia:

Anitta é vista como referência na gestão da sua carreira, da sua marca e do marketing estratégico (Leia meu outro texto: Case de Sucesso Anitta – 7 elementos fundamentais em Personal Branding).

Nada é feito em vão por ela e suas palavras são intencionais em qualquer entrevista ou discurso. Por essa característica racional, talvez a avaliação de cenários em sua estratégia de carreira pode a ter levado para essa tomada de decisão. A diplomacia não seria a melhor escolha pela posição em que eu ocupo, nacional e internacionalmente?

Ao associar o seu nome, a sua reputação, ao nome de alguém – mesmo que de forma indireta – ou mesmo de uma área – como a política, perde-se de certa forma o controle das associações que serão feitas, positivas e negativas. E para alguém que trabalhou muito e de forma muito sábia o seu nome, a possibilidade de ruir o que foi construído em anos é assustadora.

 

(In)genuidade:

Talvez a sua preocupação em influenciar o outro quanto ao voto pode ter sido crucial para que ela não escolhesse uma posição política. Será que faz sentido eu usar a minha voz para influenciar o voto de alguém, apenas por ser quem eu sou? Será que isso não vai em direção contrária à consciência política?

“Eu sou uma cidadã igual a vocês, eu trabalho pra caramba, eu pago os meus impostos. Como cidadã eu fiz o meu dever, eu pesquisei, eu li dentro do que eu acredito, tenho o meu candidato…”

Talvez ela tenha genuína ou ingenuinamente (de acordo com muitos) pensado que o seu papel de influência não deveria acessar outros campos além da música. E que ela, então, não teria autoridade para interferir no voto da população. Por isso, tal posicionamento inicial.

 

Condescendência ou Coerência:

Para muitos, ela foi condescendente. E pode ser que tenha sido condescendência da sua parte não colocar a sua marca/estratégia em risco ao defender os direitos de parte do seu público fiel. E então ser imune das consequências.

Essa atitude fez muitos se questionarem: será que o seu ativismo à nossa causa é apenas da boca pra fora, apenas quando envolver vestir as cores da nossa bandeira no trio elétrico?

Será que a sua responsabilidade política é grande demais e está acima da defesa dos nossos direitos? Será que ela realmente me representa?

Por outro lado, o seu posicionamento pode ter sido apenas reflexo da sua coerência interna. Talvez ela não acredite na política ou mesmo não se envolva com ela. Talvez ela se importe com a causa e prefira se envolver de outras maneiras, de forma que ela consiga ser ativa com suas próprias mãos. Ou talvez ela se importa com a causa, mas esse não seja um valor inegociável a ponto de tirá-la do sério (que é o que acontece quando nossos valores são denegridos) ao ser “irracional”, não pensando duas vezes antes de usar a #elenão.

Marcas Ativistas

“Uma marca não pode ser apenas sobre os seus produtos, estilo de vida e promoções – ela precisa ser também socialmente consciente” – Andrew Caravella, VP de marca na Sprout Social.

O ativismo surge como uma extensão dos valores da marca.

E o ativismo de marcas, tanto pessoais quanto de empresas, é cada vez mais demandado por seus consumidores.

O que é confirmado por um estudo recente da Sprout social, que entrevistou mais de 1000 consumidores dos EUA para entender melhor como eles querem que as marcas comuniquem sua posição e se envolvam em conversas sobre questões políticas e sociais.

O resultado?  

Dois terços dos consumidores (66%) dizem que é importante que as marcas assumam posições públicas em questões sociais e políticas.

Ou seja, não basta mais apenas se importar com seus lucros e com seus produtos. É preciso mudar a sociedade em que estamos por meio de seus poderes financeiros, de influência e de ação, já que é para isso também que escolhemos consumir tais marcas. A performance do produto não é mais o centro das decisões.  

E isso se estende para marcas pessoais, é claro. Já que também a consumimos e depositamos nossa atenção, confiança e dinheiro nelas.

O senso comum em negócios é que o envolvimento em assuntos como política deve ser evitado. Entretanto, o que parece é que na era do ativismo, essa postura precisa ser sempre avaliada, caso a caso.

Então toda marca precisa ser sócio-economicamente ativa?

Idealmente sim, mas desde que seja coerente com seus valores. E desde que exista autenticidade e verdade. E não apenas para ditar tendências por ser cool ao defender esse ou aquele interesse.

Se não há nenhuma causa com o qual se importe? Essa é a verdade da marca e é mais seguro que ela se posicione dessa maneira e não se torne um ativista da boca pra fora. A hipocrisia e a incoerência são consequências danosas a qualquer reputação.

 

Papel dos Influenciadores na Política

Essa parece ser a direção tomada pela comunicação: por anos artistas e pessoas com visibilidade que se isentaram de suas vozes na política, agora se posicionam e fazem uso do seu alcance e de sua influência na sociedade.

Se eu o consumo, ele me representa. Então se ele concorda ou não com determinada posição política, provavelmente eu também. Será?

Viver numa democracia significa que todas as vozes podem ser ouvidas. E viver na era das redes sociais, significa que muitas delas serão amplificadas.

O que também devemos refletir é: Com a capacidade de curar nossas próprias notícias no feed, com ou sem a ajuda dos algoritmos das redes sociais, podemos limitar as vozes daqueles com visões políticas opostas e acabar ouvindo apenas pessoas com quem concordamos.

Em vez de engajar com conversas e debates saudáveis para a avaliação consciente de diferentes perspectivas, acabamos nos fechando em bolhas. O resultado? A polarização e a tendência à maior intolerância.

Independente das razões para a adesão a uma causa ou movimento político, é preciso refletir: o papel de influenciadores pode nos levar à alienação? Ou isso é uma forma de colocar a nossa representatividade no jogo de forma mais democrática?

Qual a opinião de vocês?

 

Sobre Juliana Saldanha

Sou Estrategista em Personal Branding.
Tenho como missão te ajudar a posicionar-se no mercado e comunicar o seu valor de forma relevante e memorável.

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